«A
Inquisição», salientou Eduardo Lourenço, «é o mais presente,
obsessivo e enigmático episódio da nossa vida coletiva». Este
juízo pode ser estendido a Espanha e Itália, os outros países
católicos da Europa Meridional que, durante a Época Moderna, foram
fortemente caracterizados pela sua presença.
D.
João III negociou vários anos a instituição do Tribunal do Santo
Ofício em Portugal. Em 1532 viu os seus intentos satisfeitos pelo
papa Clemente VII que lho concedeu pela bula Cum ad nihil magis, de
17 de dezembro, na qual nomeava inquisidor D. Fr. Diogo da Silva.
A
reação e protestos dos cristãos novos fizeram com que o mesmo
pontífice revogasse aquela bula pela Sempiterno Regi, de 7 de abril
de 1533. Perante o desaire, o soberano não desistiu e moveu
influências. Paulo III, que sucedera a Clemente VII, respondeu com
o breve Inter coetera ad nostrum, de 17 de março de 1535,
aconselhando o monarca a seguir as regras da piedade e não as da
vingança e mandou executar o perdão concedido pelo seu antecessor.
D.
João III travou em Roma uma luta cara, a que não foram alheias as
intrigas e subornos, conseguindo que o mesmo papa Paulo III
instituísse em Portugal o Tribunal do Santo Ofício pela bula Cum
ad nihil magis, de 23 de maio de 1536. Dirigida aos bispos de Ceuta,
de Coimbra e de Lamego, nomeava-os seus comissários e inquisidores
em Portugal para procederem contra os cristãos novos e contra todos
os culpados em crime de heresia. Em 1539 D. Diogo da Silva renunciou
ao cargo de inquisidor-mor e D. João III nomeou o seu irmão, o
infante D. Henrique, arcebispo de Braga e futuro cardeal. Essa
nomeação não foi bem aceite por Paulo III que, todavia, acabou
por lhe conceder os poderes antes dados aos inquisidores.
Estava
definitivamente instituída a Inquisição em Portugal nos moldes
ambicionados pelo rei Piedoso. Tribunal simultaneamente régio e
eclesiástico, inseria-se na política de centralização do poder.
A sua criação e os seus membros estavam ligados à Igreja, mas
todo o funcionamento era superiormente controlado pelo rei, desde a
nomeação dos inquisidores-gerais, que despachavam diretamente com
o monarca, até à execução das penas de morte, para o que os
condenados eram entregues ao braço secular.
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